O filme “Os Piratas do Rock” mostra as origens das rádios piratas. E lembra como o rock´n roll foi subversivo. Hoje, virou mercadoria, mas ainda há muitos fazendo música contra as injustiças.
O ano é de 1966. O rock era considerado música perigosa. Afinal, o verbo rock, em inglês, quer dizer balançar. Rock and roll é algo como balançar e girar. Ou melhor, rebolar mesmo. É exatamente esse o movimento que quem dança rock faz. E como sabemos, movimentos com os quadris lembram o ato sexual. E sexo mais música é igual a prazer, não a reprodução da espécie. Um crime para os conservadores. Principalmente quando os maiores fãs da nova música eram jovens.
Por isso o rock foi tratado como algo extremamente subversivo quando nasceu. O novo ritmo só tocava duas horas por dia na maior rádio da Inglaterra, a BBC. Diante dessa censura não declarada, rádios que só tocavam rock começaram a surgir. A perseguição do governo britânico as jogou na ilegalidade. Para escapar à repressão, uma delas se instalou num barco. Como os piratas, ela atacava em alto mar. Longe das leis. Era a Rádio Rock.
Baseado em fatos reais, o filme de Richard Curtis conta a história dessa experiência. A produção passou despercebida por aqui, mas está nas locadoras. O elenco é ótimo: Philip Seymour Hoffman, Kenneth Branagh, Bill Nighy, January Jones, Gemma Arterton, Emma Thompson, Kenneth Branagh, Nick Frost. A história é boa e a trilha, melhor ainda. A caracterização da época também é interessante. Metade da Inglaterra, principalmente jovens e mulheres, ouvia as rádios piratas. Muitas vezes, a audição era feita escondida dos pais, maridos e patrões.
A produção surpreende ao retratar uma sociedade tão conservadora menos de 50 anos atrás. Como mostra o filme, a pílula já era bastante popular. Para o ódio da cúpula católica e conservadores em geral, libertava as mulheres de sua função reprodutiva. Dava a elas o direito de fazer sexo por prazer. O rock era só mais um elemento dessa liberdade. O problema é que o novo ritmo berrava isso aos quatro ventos nos sete mares.
Kenneth Branagh faz um ministro encarregado de acabar com as rádios piratas. Para isso, procura brechas na lei. Tenta usar força bruta. Mas, o que o personagem de Branagh não sabe é que a melhor maneira de acabar com alguns tipos de subversão anti-capitalista é torná-los objetos de consumo. Vivemos numa sociedade que gira em torno da mercadoria. Em que a maioria das coisas deixa de ter valor-de-uso para tornar-se valor-de-troca. Valor-de-uso tem a ver com qualidades. Valor-de-troca, com quantidade.
Manifestações culturais, como o rock, começam a perder suas qualidades subversivas ao se tornarem moda. Ao servirem para ajudar a fazer girar o mercado capitalista do entretenimento. Ao deixar sua dimensão qualitativa ser dominada pela lógica quantitativa. O que era criatividade desafiadora fica estéril e conformista. O mesmo vale para muitas outras coisas.
Che Guevara virou garoto-propaganda há muito tempo. A arte dos primeiros anos da Revolução Russa pode ser achada em comerciais de automóvel. Muita gente acha que Cuba já teria sido derrotada pelos Estados Unidos, se o boicote econômico fosse trocado pela venda de jeans e computadores para a Ilha de Fidel. A fé já tinha sua tabela de preços fixada nas igrejas muito antes dos neopentecostais existirem. E o sexo, tão temido nos anos 1960, hoje movimenta uma indústria de bilhões de dólares no mundo todo. Um ramo econômico que aprisionou em forma de mercadoria o corpo feminino que a pílula havia libertado.
No entanto, como diz o personagem Count (Philip Seymour Hoffman), enquanto houver gente fazendo música, político nenhum vai impedir. Sempre haverá a possibilidade de continuar fabricando subversão. E o próprio rock prova isso. Não são poucas as bandas surgidas para desafiar o capitalismo nos últimos 40 anos. Do “The Clash” ao “Rage Against Machine”. Da luta contra o racismo e o fascismo ao movimento contra a invasão do Iraque. É possível continuar fazendo música contra a injustiça social, a opressão e a exploração.
O grande problema do capitalismo é que ele não pode abrir mão totalmente dos seres humanos porque depende da exploração de sua força de trabalho. E a espécie humana tem a eterna mania de desobedecer leis naturais e sociais. Para o bem e para o mal. E quando se trata de rock contra o capitalismo, é para o bem!
29 de set. de 2009
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