Toy Story 3, Encontro Explosivo e Eclipse. Três boas bilheterias. Três exemplos do conservadorismo de Hollywood.
“Toy Story 3” é dirigido por John Lasseter. A animação competente e os efeitos em três dimensões não salvam o filme. Os divertidos brinquedos animados, liderados por Wood, estão em apuros. Seu dono cresceu e vai para a universidade. Estão entre serem esquecidos no sótão da casa ou jogados no lixo. Na confusão para escapar a tais destinos, acabam numa creche.
Poderia ser um bom pretexto para mostrar as vantagens da educação infantil em ambientes coletivos. A necessidade da diversidade social como elemento de educação e formação. A importância da posse comum de brinquedos. Talvez, a luta dos donos da creche para manterem-na aberta.
Ao invés disso, a situação é de pesadelo. O que parecia um paraíso de crianças acolhedoras mostra-se um inferno de pestinhas destruidoras. Longe dos pais protetores, os pequenos viram um bando incontrolável. Para completar, o líder do pedaço é um urso de pelúcia que não passa de um uma mistura de ditador com mafioso. Se a liberdade e a vida coletiva representam esses riscos todos, melhor se contentar com o bom e velho sótão.
O final feliz é a doação dos brinquedos a um novo lar. Tornam-se mascotes de uma garotinha gracinha, em um belo subúrbio americano. A menininha é pobre, mas isolada em sua casinha agradável está longe dos problemas que a vida comunitária causa.
Tudo muito fofinho. Tudo muito convidativo e atraente. É só sair da sala de cinema e se dirigir à loja mais próxima para comprar mais produtos da franquia. É a felicidade fácil, cara e curta na forma de bonecos sorridentes, em embalagens coloridas.
Em “Encontro explosivo”, James Mangold coloca Cameron Diaz e Tom Cruise nas mais variadas confusões. Variadas sem sair da mesmice. Muita perseguição, acrobacias, efeitos especiais e cenas que poderiam ser engraçadas mas não são.
Tudo para mostrar uma personagem feminina bancando a pateta em 90% das cenas. Caidinha pelo bonitão, que sabe tudo e vence a todos, sem tirar o sorriso cheio de dentes branqueados da cara. No final, a garota revela grande habilidade ao volante de um automóvel antigo. Mas, utiliza seus talentos única e exclusivamente para agarrar o bom partido que apareceu em sua vida chata.
Em “Eclipse”, de David Slade, a juventude está mais careta do que nunca. A começar por um vampiro bonzinho que faria Drácula querer morrer se já não fosse defunto há séculos. Neste parte da saga “Crepúsculo”, Bella está sendo disputada por seu namorado sanguessuga e seu amigo lobisomem. Nessa condição, vive sendo carregada de um canto para o outro como uma boneca.
O pior é que o jovem vampiro se recusa a transar com sua noiva antes do casamento. Ele se desculpa dizendo que é um cavaleiro do século 17. Do tipo que precisa fazer a corte à dama por meses antes de beijá-la. Mas, está mais para um adolescente do século 21 nos Estados Unidos de Bush. Aquele que recomenda não fazer sexo como a única forma de evitar Aids, gravidez indesejada, etc.
Filmes como esses deixam bem clara a principal função do cinema empresarial inspirado por Hollywood. Em meio a risadas, lágrimas, pipocas e refrigerantes nossas mentes vão sendo amaciadas. Amolecem suas defesas contra os valores mais conservadores e imbecilizantes.
28 de jul. de 2010
13 de jul. de 2010
Walt Disney, mas pode chamar de Capitão Gancho
Disney foi um dos primeiros grandes piratas da indústria de diversão. É o que revela o livro Desconstruindo a “Propriedade Intelectual”, de Jorge Machado. Uma obra que ajuda a mostrar que o capitalismo é um beco sem saída.
A Disney é uma das mais poderosas indústrias de diversão do mundo. Além do estúdio que leva seu nome, controla as empresas Touchstone, Hollywood Pictures e Miramax. Também opera os canais de TV ABC, Disney Channel e ESPN, mais centenas de emissoras de TV e rádios.
Com tanto poder acumulado nesse tipo de produção, a corporação é grande interessada no combate à pirataria de seus produtos. Mas, o fundador desse reino nada encantado dificilmente escaparia da acusação de pirataria.
Afinal, personagens como Pinóquio, Bela Adormecida, Cinderela, Alice e Peter Pan são todos de autoria conhecida. Disney produziu belos filmes a partir deles. Sua organização vem ganhando milhões há décadas graças a eles. Mas seus autores ou os sucessores deles nunca receberam um centavo por isso.
Ao mesmo tempo, Walt Disney nunca abriu mão de cobrar cada tostão pelo uso das criações que considerava sua propriedade. Mickey é a mais famosa delas. Mas até o ratinho foi baseado em um personagem do comediante David Keaton.
Por falar em Mickey, o personagem foi responsável pela alteração da lei dos direitos autorais por onze vezes nos Estados Unidos. Cada vez que os direitos sobre sua imagem iam vencer, o Congresso americano mudava os prazos para longe.
Até que em 1998, o período ficou fixado em 120 anos. Tudo isso beneficiou não apenas Disney, mas a Paramount Pictures, Time Warner, Viacom e Universal. Empresas que agradeceram aos senadores que apresentaram a lei com mais de 1,4 milhão de dólares em doações.
Tudo isso está no excelente livro de Machado. Mas, o autor também faz uma discussão importante sobre a idéia de propriedade intelectual. Segundo ele, esse conceito já nasceu equivocado. Pertence ao mundo das mercadorias físicas. Quando falamos de produtos como criações intelectuais, culturais, artísticas, o beco sem saída é o destino mais provável.
Machado lembra a definição clássica da Economia como ciência para a administração da escassez. No capitalismo, diz ele, essa escassez precisa ser produzida artificialmente. Até porque as crises capitalistas acontecem devido à abundância, lembraríamos. Elas surgem quando não há compradores para as mercadorias e não o contrário.
O problema é que propriedade intelectual diz respeito à comercialização de idéias. E a produção artificial de escassez de idéias está fora do alcance até do todo poderoso capitalismo. Para explicar melhor, Machado utiliza a famosa frase em que Thomas Jefferson refere-se à diferença entre a natureza das idéias a dos bens materiais:
O autor cita o caso da empresa Corbis, de Bill Gates. Através dela, Gates passou a cobrar direitos de exibição digital de imagens de museus e coleções públicas e privadas. Estamos falando de acervos de instituições como Galeria Nacional de Londres, Museu Hermitage de S. Petersburgo, Museu de Arte da Filadelfia, Fundação Andy Warhol, etc.
Ou seja, a rigor, qualquer um só pode utilizar uma imagem presente nessas coleções se comprar os direitos de uso junto à empresa de Gates. E trata-se de imagens de obras que pertencem ao patrimônio criativo da humanidade. O acesso a ele está bloqueado pelo “pedágio” do grande capital. Como se vê, propriedade intelectual é o nome dourado para apropriação privada do que deveria ser público.
Mas, nem tudo são facilidades para os capitalistas. A mesma tecnologia que lhes possibilita seqüestrar idéias e criações também facilita amplo acesso a elas. A internete nasceu de um projeto militar. Foi desenvolvida por universidades públicas. É explorada no mundo todo por grandes corporações voltadas para o lucro. Mas, é igualmente uma ameaça à propriedade intelectual.
Isso acontece porque a lógica da rede mundial é a do compartilhamento. De outro modo, não faria tanto sucesso. É por isso que as tentativas de impedir completamente a troca desautorizada de arquivos na rede lembram o esforço de enxugar gelo. As empresas querem produzir escassez de idéias através do controle monopolista de suas cópias. No entanto, a própria competição comercial estimula um avanço tecnológico que torna o ato de copiar cada vez mais simples e barato. E seus caminhos cada vez mais imateriais, intangíveis.
Já não são fitas-cassetes, discos de vinil, CDs e DVDs que suportam as informações. São arquivos circulando pela internete. As idéias, lembra o autor, além de intangíveis, são inesgotáveis. Por mais originais que sejam, são produto de outras idéias. E, logo que são transmitidas, socializadas, sofrem modificações sobre as quais seus pretensos autores originais não têm muito controle.
Para dar conta desta realidade, Machado propõe o conceito de co-produção, no sentido de que toda a criação é social. Em relação aos limites da concepção de “propriedade intelectual”, o autor propõe a adoção da figura dos “direitos de uso”. Um conceito que regula a posse entre sociedades sem propriedade privada, como as tribos indígenas ou antigas comunas. A posse só existe em relação àquilo que se está usando. Findo o uso, a posse volta a ser comum.
Na verdade, a indústria já utiliza esse conceito. Já não vende seus programas, mas os direitos de uso. A grande diferença é que cobra por eles. E o faz periodicamente. Uma demonstração de que os próprios capitalistas encontram dificuldades para continuar lidando com a idéia de propriedade. Ela escapa por entre seus dedos gananciosos.
A conclusão a que o autor chega merece ser transcrita:
A propriedade privada dos meios de produção social tem que dar lugar a sua posse compartilhada em todos os níveis. Para que a produção abundante do sistema capitalista pare de se transformar em escassez para a maioria e fartura para a minoria. E a criatividade humana seja libertada das correntes econômicas que a prendem.
Não é preciso dizer que o livro de Jorge Machado pode ser facilmente encontrado na internete e baixado gratuitamente.
Leia também:
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Rock bom é rock pirata!
A Disney é uma das mais poderosas indústrias de diversão do mundo. Além do estúdio que leva seu nome, controla as empresas Touchstone, Hollywood Pictures e Miramax. Também opera os canais de TV ABC, Disney Channel e ESPN, mais centenas de emissoras de TV e rádios.
Com tanto poder acumulado nesse tipo de produção, a corporação é grande interessada no combate à pirataria de seus produtos. Mas, o fundador desse reino nada encantado dificilmente escaparia da acusação de pirataria.
Afinal, personagens como Pinóquio, Bela Adormecida, Cinderela, Alice e Peter Pan são todos de autoria conhecida. Disney produziu belos filmes a partir deles. Sua organização vem ganhando milhões há décadas graças a eles. Mas seus autores ou os sucessores deles nunca receberam um centavo por isso.
Ao mesmo tempo, Walt Disney nunca abriu mão de cobrar cada tostão pelo uso das criações que considerava sua propriedade. Mickey é a mais famosa delas. Mas até o ratinho foi baseado em um personagem do comediante David Keaton.
Por falar em Mickey, o personagem foi responsável pela alteração da lei dos direitos autorais por onze vezes nos Estados Unidos. Cada vez que os direitos sobre sua imagem iam vencer, o Congresso americano mudava os prazos para longe.
Até que em 1998, o período ficou fixado em 120 anos. Tudo isso beneficiou não apenas Disney, mas a Paramount Pictures, Time Warner, Viacom e Universal. Empresas que agradeceram aos senadores que apresentaram a lei com mais de 1,4 milhão de dólares em doações.
Tudo isso está no excelente livro de Machado. Mas, o autor também faz uma discussão importante sobre a idéia de propriedade intelectual. Segundo ele, esse conceito já nasceu equivocado. Pertence ao mundo das mercadorias físicas. Quando falamos de produtos como criações intelectuais, culturais, artísticas, o beco sem saída é o destino mais provável.
Machado lembra a definição clássica da Economia como ciência para a administração da escassez. No capitalismo, diz ele, essa escassez precisa ser produzida artificialmente. Até porque as crises capitalistas acontecem devido à abundância, lembraríamos. Elas surgem quando não há compradores para as mercadorias e não o contrário.
O problema é que propriedade intelectual diz respeito à comercialização de idéias. E a produção artificial de escassez de idéias está fora do alcance até do todo poderoso capitalismo. Para explicar melhor, Machado utiliza a famosa frase em que Thomas Jefferson refere-se à diferença entre a natureza das idéias a dos bens materiais:
Aquele que recebe de mim uma idéia tem aumentada sua instrução, sem que eu tenha diminuído a minha. Como aquele que acende sua vela na minha, recebe luz sem apagar a minha.Talvez Jefferson não desconfiasse que num futuro nem tão distante, também as idéias, o saber, a informação viriam a ser negociadas no mercado.
O autor cita o caso da empresa Corbis, de Bill Gates. Através dela, Gates passou a cobrar direitos de exibição digital de imagens de museus e coleções públicas e privadas. Estamos falando de acervos de instituições como Galeria Nacional de Londres, Museu Hermitage de S. Petersburgo, Museu de Arte da Filadelfia, Fundação Andy Warhol, etc.
Ou seja, a rigor, qualquer um só pode utilizar uma imagem presente nessas coleções se comprar os direitos de uso junto à empresa de Gates. E trata-se de imagens de obras que pertencem ao patrimônio criativo da humanidade. O acesso a ele está bloqueado pelo “pedágio” do grande capital. Como se vê, propriedade intelectual é o nome dourado para apropriação privada do que deveria ser público.
Mas, nem tudo são facilidades para os capitalistas. A mesma tecnologia que lhes possibilita seqüestrar idéias e criações também facilita amplo acesso a elas. A internete nasceu de um projeto militar. Foi desenvolvida por universidades públicas. É explorada no mundo todo por grandes corporações voltadas para o lucro. Mas, é igualmente uma ameaça à propriedade intelectual.
Isso acontece porque a lógica da rede mundial é a do compartilhamento. De outro modo, não faria tanto sucesso. É por isso que as tentativas de impedir completamente a troca desautorizada de arquivos na rede lembram o esforço de enxugar gelo. As empresas querem produzir escassez de idéias através do controle monopolista de suas cópias. No entanto, a própria competição comercial estimula um avanço tecnológico que torna o ato de copiar cada vez mais simples e barato. E seus caminhos cada vez mais imateriais, intangíveis.
Já não são fitas-cassetes, discos de vinil, CDs e DVDs que suportam as informações. São arquivos circulando pela internete. As idéias, lembra o autor, além de intangíveis, são inesgotáveis. Por mais originais que sejam, são produto de outras idéias. E, logo que são transmitidas, socializadas, sofrem modificações sobre as quais seus pretensos autores originais não têm muito controle.
Para dar conta desta realidade, Machado propõe o conceito de co-produção, no sentido de que toda a criação é social. Em relação aos limites da concepção de “propriedade intelectual”, o autor propõe a adoção da figura dos “direitos de uso”. Um conceito que regula a posse entre sociedades sem propriedade privada, como as tribos indígenas ou antigas comunas. A posse só existe em relação àquilo que se está usando. Findo o uso, a posse volta a ser comum.
Na verdade, a indústria já utiliza esse conceito. Já não vende seus programas, mas os direitos de uso. A grande diferença é que cobra por eles. E o faz periodicamente. Uma demonstração de que os próprios capitalistas encontram dificuldades para continuar lidando com a idéia de propriedade. Ela escapa por entre seus dedos gananciosos.
A conclusão a que o autor chega merece ser transcrita:
O casamento entre “propriedade intelectual” e meios digitais não tem como dar certo. Pois, enquanto um fala em bloqueio, o outro fala em fluxo. Um quer vender, o outro quer compartilhar. Um fala que tudo tem um “proprietário”, outro mostra que não tem. Um quer cobrar, o outro não acha justo pagar. Um quer reter, o outro quer liberdade! E o pior, um está enamorado das corporações, outro procura alguém mais “descolado”.Ao mesmo tempo, não se trata de desconhecer os direitos autorais. Segundo Machado:
Deve-se garantir ao (co-)criador, além do reconhecimento da contribuição original, o direito exclusivo sobre o comércio da mesma, sempre que houver. Isso não impediria o fluxo da informação amigável, sem fins lucrativos.Esta pode ser uma saída provisória. Uma forma de regular o mercado enquanto não nos livrarmos dele. Pois, diferente do que parece entender o autor, o conceito de propriedade privada não está caducando apenas no âmbito da criação intelectual. Esta é apenas a área em que fica mais clara a senilidade de todo o sistema capitalista.
A propriedade privada dos meios de produção social tem que dar lugar a sua posse compartilhada em todos os níveis. Para que a produção abundante do sistema capitalista pare de se transformar em escassez para a maioria e fartura para a minoria. E a criatividade humana seja libertada das correntes econômicas que a prendem.
Não é preciso dizer que o livro de Jorge Machado pode ser facilmente encontrado na internete e baixado gratuitamente.
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